quinta-feira, 15 de agosto de 2013

15 de agosto

Noites que passam notadamente marcadas.
A vida que passa vagarosamente desvairada.
Cidade pequena, interiorana, mas minha.
Onde a rua se vê da janela e nela se caminha.

Longos eram os dias de 15 de agosto com meu irmão.
Molecagem, barulho, procissão e feriado.
Era dia de festa, era o dia da santa.
De dia corria para passar a noite vidrado.

Àquela época não chamava alguém por baby,
nem juraria amores a uma tal menina.
Onde não havia a maldade, onde hoje é melancolia.
Àquela época a vida era plena inocência.

Indecência era não assistir ao foguetório.
Aquilo tudo se fazia de encher os olhos.
Velho amor e seu desgosto,
me deixam saudades dos velhos '15 de agosto'.

Por Carlos Fernando Rodrigues   S.S.D.

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Obituário

     Aos senhores, senhoras, senhoritas, jovens e crianças que venham a ler esta carta, antecipo-vos que nem tudo o que irão ler esta carta, antecipo-vos que nem tudo o que irão ler possa vir a ser de vosso agrado por não estar de acordo com a sua moral, pensamento ou idealizações vãs iniciadas a partir de uma visão, seja ela romântica ou realista da vida. Aqui estarão expressos pensamentos lógicos, contraditórios, vivos, mortos, livres, soltos e presos. Sendo assim, e sem a intenção de ser rude em momento algum, peço que só se pronuncie sobre o objeto de sua leitura se preciso for, independente de críticas positivas ou negativas.
     Sempre penso em começar um texto como esse com expressões formais clássicas, como aquelas de documentos, contratos e demais objetos que refletem a sistematização da vida pelo ser humano. Porém não creio que seria adequado mediante tamanha confusão mental, sentimental e orgânica do indivíduo que vos escreve. E apesar de minha notória e habitual prolixidade, tentarei me expressar por palavras mais simplórias, mas não garanto o sucesso dessa tentativa, assim como até hoje não garanti de nenhuma que tenha feito na vida, apesar do relativo acerto em algumas. Sem mais delongas explanatórias, vamos ao motivo propulsor desta inglória redação:
    Recentemente, algumas experiências, boas e ruins, me levaram a profundas reflexões sobre a essência do meu ser. Toda aquela balela psicológica e religiosa a partir de vagos momentos criaram lógica e sentidos nunca antes experimentados pelo meu esclarecido ser. Não digo do ser sensível, de impressões rasas, mas sim do meu âmago racional, talvez nem sempre presente, mas que ainda me pertence. Ele sim foi capaz de absorver as imposições da sensibilidade de forma com a qual o próprio não idealizava ser capaz. Apesar dessa virtude, rara em mim, não focarei o que chamarei por "isto" nela, e sim nas questões sensíveis que levaram à bancarrota do meu inflável ego.
      É lindo ser capaz de protestar. O protesto pelo protesto pode ter o resultado exatamente contrário quando não se sabe por que e contra o que protestar. Eu resolvi que queria lutar pelo amor. Uno, geral, pessoal, total. Escrevi para vários deles, expus-me para tantos outros e, na hora de lutar pelo meu, não alcei ao objetivo traçado e tive toda minha expectativa frustrada por valores consideravelmente menores que penetraram disfarçadamente nas entranhas da minha relação com este sentimento ébrio do ser humano e sua representação. Poderia descrever como, com quem e porquê, mas não creio que meu ser seja o primeiro nem o último a se sentir dessa forma, sendo que assim prefiro restringir minha intimidade aos "amigos". Chegando a este ponto, me permito dizer que o amor corroeu de forma dolorosa minha experiência sensível, porém é esse um dos principais defeitos da visão romântica da vida da qual ainda reluto em abrir mão, apesar de estar ciente da possível cagada monumental na qual esteja me metendo, para mais de uma vida.
      Como bem disse anteriormente, resolvi restringir minha intimidade aos meus amigos. Pessoas pelas quais senti amizade. Algo bem próximo do amor, porém mais sereno. Algo que deveria ter servido para acalmar os ânimos provocados pela droga amorosa, mas que em alguns isolados casos se revelou uma contra-indicação fortíssima, podendo potencializar os efeitos da primeira, causando sentimentos e ideias terríveis ao meu ser irracional e impulsivo.
   Minha tentativa a partir de então seria alcançar a paz interna, desintoxicando-me de amores e amizades falhos e talvez por este sentimento vocês agora estejam lendo essa canalização indevida de uma morte de um ex-ser. Não digo que por isso seja o fator exclusivo, mas foi de fato um cúmplice, como se em um trio o fizessem, apesar de sua culpabilidade ser comprovada como relativa neste caso.
      Dessa forma explicito as causas que levaram ao óbito de um famigerado eu, antigo e obsoleto ser voraz em seus amores, intensamente inocente em suas amizades e incapaz de ser pacífico consigo. E depois de tudo, ainda que exista eu, o que se seguirá será transmitido como bem de valor a quem quiser e se disponibilizar a pegar. Deixo posto a vocês meus amores, colocando de forma geral, meu amor. Não abro mão disso, mas ainda assim o terão aqueles que desejarem. A vocês que venham a querer, eu vos amo. Não desesperarei se ninguém o quiser, pois a porção a qual guardo pra mim é suficiente para que não me perca pela sua falta. Não estarei afobado se todos se manifestarem positivamente, pois ele é suficiente a todos, não saberia dizer quanto a qualificação. Aprendam sobre ele no meu passado e saibam que é falho, viva-o agora e experimentem sua plenitude, aguardem o futuro e ele ainda estará lá. Já não espero reciprocidade, mas aos bem aventurados, que o façam. As minhas amizades eu agradeço e também as deixo para quem necessite e quiser fazer proveito delas, como eu fiz, afinal, sempre fui meu maior amigo. Sem ofensas, mas fui a única presença que sempre me suportou. Ela estará aqui, mas ainda não sei se como a antiga. Ela é esguia, desconfiada, assustada e agressiva potencialmente ao ego. A paz que nunca tive ficará pelo caminho para que alguém a encontre. A minha se encontrará agora, ao fim dele. Ao fim disto que você ainda insiste em ler.
      Meu ser sensível, já não era sem tempo, esgotou-se. Apanhou, amou, foi amigo, desgastou-se, viajou, revelou-se, sofreu e enfim morreu. Já está morto há algum tempo, ser sensível insensivelmente mórbido. Vos escreve sem a menor propriedade. Utiliza-se da limitada capacidade do ser racional para se despedir, o sufoca para que não deixe meu único sensato adeus. Não se questione o que será deles, será vida e morte. Não chamaria por dor, amor, sorte ou amizade. Simples e significativamente será. Sendo assim e portanto, declaro pessoalmente e oficialmente o óbito destes dois incautos indivíduos. Que suas ausências sejam imediatamente supridas, não sentidas e suas experiências estejam disponíveis a quem as queira. Amo-vos ó amigos e amores em potencial. Vão em paz enquanto os carrego ao longo da eternidade.

Por Carlos Fernando Rodrigues   S.S.D.